Duas testemunhas de uma ação trabalhista foram presas em flagrante por mentirem diante de um juiz durante audiência na Justiça do Trabalho de Campo Largo, Região Metropolitana de Curitiba (RMC). A decisão do juiz Marlo Augusto Melek foi considerada surpreendente. Ele aguardou a chegada da Polícia Federal para conduzir os presos e seguir com a audiência, e aplicou na hora uma multa à preposta (representante da empresa) no valor de R$ 5 mil em favor do autor da reclamatória em questão.
A decisão desta semana foi uma mostra da mudança de pensamento da Justiça após as alterações da reforma trabalhista, das quais o próprio juíz Melek foi um dos redatores.
Uma grande loteria na qual todo mundo vai tentar a sorte. Até julho do ano passado era assim que muita gente enxergava a Justiça do Trabalho. Principalmente aqueles que buscavam tirar vantagem sobre conflitos trabalhistas. Para tanto, valia tudo em audiência. Mentir, omitir informações, inventar histórias e recorrer ao bom e velho “não me lembro”.
Ao que tudo indica, porém, depois da entrada em vigor do texto que reformou a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), isso já está mudando e, em tribunais de todo o país, juízes têm pesado a mão nos “espertinhos” de plantão. No Paraná, este caso não deixa dúvidas a respeito do rigor com o qual o judiciário tem encarado a deslealdade em juízo. Para explicar melhor como isso está funcionando, a Tribuna do Paraná foi esclarecer algumas dúvidas.
A verdade
“Você jura dizer a verdade, somente a verdade, nada mais que a verdade perante Deus?” – pergunta a corte à testemunha que, com uma das mãos estendida sobre a Bíblia Sagrada, se compromete a não mentir para o juiz. A cena clássica dos filmes americanos faz muita gente pensar que no Brasil também é assim. Mas não é. Previsto em lei, o chamado “compromisso legal”, da justiça brasileira, determina que – antes de qualquer audiência – os juízes advirtam as partes litigantes sobre a obrigação de dizer a verdade sob risco de cometerem o crime de falso testemunho (que pode gerar pena de 3 a 4 anos de prisão). Sem drama, sem Bíblia.
Mesmo assim, muita gente conseguia “dar seus pulos”, e passar impune ao mentir em juízo. Tendo em vista estabelecer a ordem, e “acabar com a festa” de muitos espertinhos, a Reforma Trabalhista impôs mais rigor nestes casos a partir da criação de um novo artigo – o 793 – que determina àquele que litigar de má-fé a responsabilidade de arcar com perdas e danos (multa) no processo. Em alguns casos mais graves, nos quais a mentira venha a prejudicar muito a outra parte, pode até ser determinada a prisão.
Logo, juízes trabalhistas de todo o Brasil começaram a por em prática a nova regra, pesando a mão tanto sobre autores quanto sobre réus. Em fevereiro, Delano de Barros Guaicurus, magistrado da 33ª Vara Trabalhista do Rio de Janeiro, condenou um trabalhador que agiu comprovadamente de má-fé ao pagamento de 15% do valor da causa – antes mesmo do julgamento da ação – depois que teve conhecimento de uma mensagem de celular na qual o funcionário acertava valores a serem passados para uma testemunha em seu favor. Já em Caieiras, interior de São Paulo, uma testemunha teve de pagar mais de R$ 12 mil (5% do valor da causa) à parte autora por ter mentido em depoimento.
Exemplo paranaense
O “migué” dado pelas testemunhas do caso paranaense foi descoberto pelo magistrado no fim da audiência, quando uma gravação que havia sido anexada aos autos separadamente foi apresentada pelos autores, comprovando o pagamento dos valores negados anteriormente. Determinada a prisão, a audiência foi interrompida até a chegada dos policiais que conduziram os mentirosos à Polícia Federal.
Nos autos, o próprio juiz reconheceu a decisão como enérgica, porém necessária. “Reconheço que a prisão em flagrante é uma medida extrema e que em 13 anos de carreira a determinei apenas 03 vezes. Além da legalidade da prisão, ora determinada, é certo que essas testemunhas vem reiteradamente mentindo em inúmeros processos, violando toda a sorte possível na legislação trabalhista, penal e adjetiva, causando prejuízo sem precedentes à correta prestação jurisdicional, sendo que dezenas de processos poderão ser revistos em Ação Rescisória, pela ausência de lisura da prova produzida. Assim, lamentável a conduta da preposta da reclamada e suas testemunhas indicadas” – ressaltou no processo.
Procurada pela Tribuna do Paraná, a empresa envolvida no processo declarou, por meio de seu advogado, que não vai se pronunciar sobre o caso e que a questão voltará a ser discutida apenas no âmbito do processo.
Para esclarecer algumas dúvidas a respeito das sanções às quais passam a estar sujeitos os mentirosos de carteirinha, a Tribuna do Paraná conversou com o juiz Marlon Augusto Melek, que explicou como a Justiça do Trabalho em nosso estado passa a encarar esse tipo de conduta.
Créditos: Tribuna do Paraná