Atualizado em 06/03/2020
Mulheres estão assumindo a linha de frente do Exército brasileiro

Após 198 anos, as mulheres estão rompendo a última barreira que faltava para a inclusão completa nos quadros do Exército Brasileiro, num processo de transformação da instituição que teve início em 1992. No próximo ano, formam-se as primeiras combatentes na Academia Militar dos Agulhas Negras (AMAN), que passarão a fazer parte da tropa em 2022. Além disso, no Paraná elas já são uma parcela considerável do efetivo, além de serem a maioria - e as que apresentam as melhores notas - nos processos seletivos.

 

De todo o efetivo de oficiais e sargentos no Paraná, por exemplo, 35% são mulheres, sendo que em áreas como a da Saúde o porcentual chega a até 80%. Além disso, no ano passado os processos seletivos do Exército, que servem para a contratação de militares temporários, tiveram um total de 8 mil inscritos e mais da metade (53%) foram mulheres que se inscreveram.

“O índice de participação feminina vem aumentando. Neste ano, duas áreas que seriam predominante masculinas, de mecânico e motorista de carreta, as primeiras colocadas foram mulheres”, comenta o Coronel Paulo Henrique Maier, Chefe do Escalão de Pessoal. “Causou uma primeira surpresa, mas depois, ao olhar a parte de currículo, preparação profissional, são profissionais altamente capacitadas. A mecânica já está trabalhando e no segundo semestre teremos duas mulheres motoristas de carreta no Paraná”.

De acordo com o Coronel Fabrício Ramires Pinto, Chefe do Estado-Maior da 5ª Região Militar, a presença da mulher dentro do Exército é um retrato da sociedade. “Ela ganhou muito campo de trabalho, em todas as profissões, e no Exército não é diferente”, aponta o militar, comentando ainda que, por ser a mais conservadora das três instituições que compõem as Forças Armadas, o Exército acabou sendo o último a inserir a mulher. “Mas isso aconteceu lá na década de 1990. Antes a Marinha foi a precursora, depois a Força Aérea.”

 

 

Atualmente, a maioria das mulheres estão na parte técnica do Exército. São administradoras, assistentes sociais, engenheiras, enfermeiras, jornalistas e médicas, por exemplo. Em breve, contudo, elas também passarão a integrar a tropa, se tornando combatentes e assumindo a linha de frente. É que no ano que vem se forma a primeira turma da AMAN com mulheres, e a partir de então elas passarão a integrar a tropa. Conforme explica o Coronel Maier, trata-se da última etapa que faltava para o Exército completar a inclusão feminina em seus quadros.

“Ano que vem teremos essa experiência das mulheres, que se formaram na área bélica, na tropa. Nas outras áreas todas já temos a presença feminina consolidada”, explica o Coronel Maier. “Isso é bacana. Na AMAN, dos 10 primeiros colocados (dessa turma que vai se formar), sete são meninas. Daqui a 20 anos, talvez, eu vá ter um efetivo com até 50% de mulheres. Ainda não temos serviço militar obrigatório com meninas, quem sabe no futuro...”, complementa o Coronel Ramires Pinto.

'No Exército, o que existe é a igualdade', diz tenente-coronel

Desde 1997 no Exército, a Tenente-Coronel Engenheira Militar Cristina Fleig Mayer é hoje Comandante da Comissão Regional de Obras/5, responsável por todas as obras nas unidades militares do Paraná e de Santa Catarina. Quando ela ingressou nos quadros da instituição, eram poucas as mulheres militares, tendo a tenente-coronel feito parte da primeira turma de engenheiras militares.

"Era novidade, muitos quartéis não tinham mulheres. Para o pessoal mais antigo foi uma coisa diferente, então eles tiveram de se acostumar", recorda a militar, que celebra o avanço feminino dentro dos quadros da instituição. "O fato de ter alguém como eu chefe de organização militar de engenharia, isso motiva outrasmulheres. Eu tenho observado, as pessoas me procuram e até na rua, as vezes eu estou fardada, as pessoas querem saber. Tem muita mulher interessada em participar disso."

A Tenente-Coronel conta também que vivenciou a desigualdade que existe entre homens e mulheres no mercado de trabalho quando ingressou no setor privado, em 1995, após se formar engenheira. Hoje, avalia que a situação persiste a partir dos relatos de sua filha, que é publicitária. Só que no Exército, garante, isso é diferente.

“As vezes as pessoas pensam que no Exército, por ser uma instituição formada só por homens, também existe essa diferença. Só que no Exército existe a igualdade, porque isso é lei. Então recebemos o mesmo salário, a participação é a mesma, nosso trabalho é o mesmo. Temos engenheiras e arquitetas, elas vão para obra, sobem no telhado... Na época em que me formei sentia uma certa diferença de oportunidade para homens e mulheres, e quando eu entrei (no Exército) vi que não teria mais esse problema.”

'Sempre tiveram muitos questionamentos', conta tenente

Há um ano no Exército, a 2º Tenente Odelita Herbst Milane, Assistente Social da 5ª Região Militar, conta que jamais imaginou que um dia se tornaria uma militar. E se ela não esperava por isso, a surpresa também foi grande entre familiares e conhecidos quando ela anunciou que estaria ingressando na Instituição>

“Foi uma grande surpresa. Nunca imaginei ir para área militar, não tinhamilitar na família, nenhum tipo de convívio, nada. Recebi grande apoio,mas também sempre tiveram muitos questionamentos:o que eu ia fazer? Viraria soldado? Teria de vestir fardamento? Qual seria minha função?”, afirma a tenente, que celebra o fato de ter conseguido, a partir disso, ajudar outras mulheres a ingressarem no Exército.

“Aí vai descobrindo um novo mundo, outras colegas resolveram participar também (do processo seletivo). Ainda tem muita coisa de censo comum, as pessoas pensam que é uma coisa de homem. Mas conhecendo as diversas áreas a gente vê que até em profissões mais masculinizadas, como engenharias, parte de tecnologia da informação, hoje tem mudado muito, e não só no meio militar, mas no meio civil também”, finaliza.

Hospitais Gerais estão nas mãos delas

Com 129 anos de existência, o Hospital Geral de Curitiba está sendo dirigido pela primeira vez por uma mulher. No dia 18 de fevereiro de 2020, o Tenente Coronel Médico Frederico Marcelo de Souza Coelho transmitiu a Direção do HGeC para a Tenente Coronel Médica Regina Lúcia Moura Schendel, nascida no Rio de Janeiro e desde 1998 no Exército. Antes disso, em 13 de dezembro do ano passado, o Coronel Médico Sérgio Luis Hammes já havia passado a direção do Hospital de Guarnição de Florianópolis (HGuFl) para a Coronel Médica Carla Lobo Loureiro, também a primeira militar do segmento feminino a comandar o hospital.

Em breve, a primeira general do Exército

No Exército Brasileiro ainda não há nenhuma mulher General. Essa situação, no entanto, está prestes a mudar. É que nos próximos três anos teremos as primeiras oficiais chegando ao generalato. “No Exército, tudo já está previsto. Para usar a palavra damoda, o compliance do Exército está escrito desde a sua formação. Então como a gente já sabe todo nosso plano de carreira, daqui três anos as turmas que se formaram em 1992 vão concorrer ao generalato, o que significa que daqui três anos com certeza nós teremos uma oficial general”, comenta o Coronel Maier. “(Com uma mulher) chegando ao oficial general, talvez algumas mudanças aconteçam no Exército no sentido dessa participação feminina, um maior incentivo. Nos últimos cinco anos foi quase 30% de aumento e só tem aumentado cada vez mais”, emenda a Tenente-Coronel Mayer.

Créditos: Bem Paraná - Foto: Franklin de Freitas

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