O governo federal trabalha com a expectativa de que o plenário do Senado vote – e aprove – em novembro a proposta que autoriza a venda da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT). O projeto de lei 591/21, de autoria do Executivo, recebeu o aval da Câmara dos Deputados em 5 de agosto.
Hoje os Correios estão presentes em 5.556 municípios brasileiros, com um total de 11.124 agências. A estatal tem cerca de 98 mil funcionários.
Caso a proposta avance no Congresso, será a segunda vitória do governo no campo das privatizações. A primeira ocorreu em 21 de junho, quando os parlamentares aprovaram a medida provisória 1.031, que abre caminho para a privatização da Eletrobras.
Confira a seguir quais são as etapas necessárias para a conclusão do processo de desestatização da estatal:
1. Tramitação no Senado
O PL 591/21 tramita no Senado, onde, para muitos interlocutores, o debate é mais difícil, dada a resistência de muitos senadores quanto à proposta e o impacto eleitoral que sua eventual aprovação pode ter.
Na Casa, quem relata o projeto é o senador Márcio Bittar (MDB-AC). A expectativa é de que ele entregue seu parecer na segunda quinzena de outubro e que a matéria seja votada até novembro. A projeção de votação em novembro também consta do cronograma de trabalho do ministro das Comunicações, Fábio Faria.
2. Se alterado, PL volta para a Câmara
Se os senadores aprovarem com mudanças o projeto de desestatização dos Correios, o texto retornará à Câmara para nova análise dos deputados. Esse é um dos temores do governo, pois com a proximidade do fim do ano, o PL poderia não ser votado. Na Casa, quem relata a proposta é o deputado Gil Cutrim (Republicanos-MA).
Conforme disse ao jornal "O Estado de S. Paulo", no entanto, Bittar não pretende alterar a proposta. Nesse caso, se o texto dele passar sem mudanças pelo plenário, a matéria poderia ir direto à sanção presidencial.
3. Possíveis desdobramentos jurídicos
Mesmo se aprovada pelo Congresso, a proposta poderá esbarrar em questões jurídicas. Se isso ocorrer, os passos seguintes ficariam travados. Impetrada pela Associação dos Profissionais dos Correios (ADCAP), a ação direta de inconstitucionalidade (ADI) 6.635/DF, que está sob relatoria da ministra Carmen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), sustenta que o Decreto 10.674/2021 – que incluiu a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) no Programa Nacional de Desestatização (PND) – é inconstitucional.
Nessa ação, a Procuradoria-Geral da República (PGR) já se manifestou contrária à desestatização total da companhia. Na avaliação do procurador-geral, Augusto Aras, a transferência do serviço postal e do correio aéreo nacional ao setor privado é inconstitucional. O próprio STF já se manifestou sobre a questão, ainda em 2005, ao definir que os serviços postais devem ser prestados pelo Estado.
A Constituição determina que compete à União manter o serviço postal e o correio aéreo nacional. O governo, por sua vez, tomou como fundamento legal para a privatização da estatal uma autorização genérica de desestatização contida no inciso I do art. 2º da Lei 9.491/1997. Segundo o Executivo, trata-se de norma legal que autoriza, em tese, a desestatização dos serviços postais.
O que o PL 591/2021 faz é estabelecer que a manutenção de serviços prevista pela Constituição "dar-se-á pela garantia da prestação do serviço postal universal e pela regulação e organização do Sistema Nacional de Serviços Postais". Pela proposta, esse ponto seria atendido por meio de concessão, e o novo operador da empresa deveria obedecer o comando de um serviço postal universalizado, atendendo a toda a população e assegurando a continuidade do serviço postal universal.
4. Sanção presidencial
Se não houver desdobramento jurídico, a privatização dos Correios vai à sanção presidencial por parte de Jair Bolsonaro. O chefe da República tem 15 dias úteis para sancionar a medida e convertê-la em lei ordinária. Ele pode tanto aprovar integralmente o texto quanto vetar determinados trechos da proposta.
Como estabelece a Constituição Federal, o chefe do Executivo poderá exercer veto a algum projeto legislativo aprovado pelo Parlamento por motivo de 1) inconstitucionalidade (conhecido como veto jurídico) ou 2) contrariedade ao interesse público (conhecido como veto político).
Nos termos do artigo 66 da CF, o veto pode se dar de forma parcial – mas, neste caso, isso deve ocorrer sobre texto integral de artigo, parágrafo, inciso ou alínea. O presidente não pode, por exemplo, vetar parte de um parágrafo.
Ainda segundo o que define a Carta Magna, caso o presidente considere o projeto, no todo ou em parte, "inconstitucional ou contrário ao interesse público, vetá-lo-á total ou parcialmente, no prazo de quinze dias úteis, contados da data do recebimento, e comunicará, dentro de quarenta e oito horas, ao presidente do Senado Federal os motivos do veto".
A partir daí, senadores e deputados, em sessão conjunta e pelo prazo de 30 dias, devem avaliar o veto presidencial, que só pode ser rejeitado pelo voto da maioria absoluta dos parlamentares. Se isso acontecer, o texto retorna para o presidente, que tem o prazo de 48 horas para sancioná-lo. Em caso de "inércia", o Congresso tem autoridade para sancionar a proposta legislativa.
5. TCU analisa processo
O passo seguinte é de responsabilidade do Tribunal de Contas da União (TCU), que analisa os processo de privatização para detectar possíveis irregularidades e, após isso, homologar a operação. O aval do tribunal é essencial para reduzir chances de judicialização do processo de venda. Ele também dá segurança jurídica aos interessados.
6. BNDES publica edital
Após a análise do TCU, o modelo de venda deve passar por aprovação do conselho interministerial, composto pelo Ministério da Economia, Ministério das Comunicações e Correios, e também por apreciação do conselho do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI).
Se aprovado, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) deve publicar o edital com as regras da desestatização dos Correios. Isso deve ocorrer em meados de abril, de acordo com a expectativa do banco, que é responsável por contratar os estudos técnicos que vão formatar a modelagem da privatização. A BR Partners, o Consórcio Postar e o Consórcio Carta Brasil foram selecionados para a realização dos estudos.
7. Leilão dos Correios
O último passo é a venda da empresa. A expectativa do governo é realizar o certame no primeiro semestre de 2022. Se preservadas as diretrizes atuais, a venda ocorrerá por meio de leilão e será criado um marco regulatório para o setor, hoje em regime de monopólio. A proposta também definirá normas gerais para o Sistema Nacional de Serviços Postais (SNSP), além de direitos e deveres dos consumidores e regras genéricas para as empresas privadas que entrarem no mercado postal.
O comprador da estatal terá de assumir a futura concessão para a manutenção dos serviços postais em todas as regiões do país. Embora encerre o monopólio dos Correios sobre esse serviço, abrindo espaço a outras empresas, a companhia, após a privatização, ainda será a única prestadora por "pelo menos cinco anos".
A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) terá suas competências alteradas e passará a se chamar Agência Nacional de Comunicações (Anacom), regulando também os serviços postais.
Créditos: Gazeta do Povo Foto: Reprodução